A génese do Movimento Nacional dos Baldios, materializada no projeto BALADI e outras associações de compartes, é encontrada nas ações de resistência popular, no silêncio e amargura de muitos camponeses do norte e centro do país à espoliação das suas terras baldias, acompanhada por perseguições, proibições e prisões de tão má memória. Assuntos de muitas conversas ao redor das lareiras das gentes Beirãs, Transmontanas e Minhotas, onde ardia a lenha e a carqueja dos baldios, mas também a revolta!

Foi um período negro da história do país, o início do esbulho dos baldios pela ditadura de Salazar, com a submissão dos Baldios ao Regime Florestal tendo por base a Lei nº 1938, eufemisticamente conhecida por Lei do Povoamento Florestal. Em contexto político e social o roubo dos baldios aos povos serranos emerge como um dos eixos centrais de ataque à agricultura familiar do Norte e Centro do País e que conduz, à emigração e à trágica erosão demográfica do mundo rural Português, uma vez que, como era de esperar, o roubo das terras baldias significou a venda de animais, liquidação das explorações agrícolas, abandono e desertificação das zonas serranas. Foi também o início de uma luta sem tréguas de organização e resistência, face à submissão dos terrenos baldios ao Regime Florestal por parte dos Serviços Florestais. Luta imortalizada na obra literária do Mestre Aquilino Ribeiro no livro “Quando os Lobos uivam”. Os povos nunca se conformaram, resistiram às ocupações um pouco pelo País desde Castro Laboreiro e Soajo ao Gerês, Barroso, Montezinho e da mítica “serra dos Milhafres” à Serra das Talhadas, Concelho de Sever de Vouga. Foi uma luta verdadeiramente heroica, tão bem retratada no Livro do jornalista “Armando Pereira da Silva – Ocupação sem limites”.

Dado este lastro de ação e luta, a vontade e o querer das gentes rurais, conjugado com o 25 de Abril, não admira que de imediato reclamassem junto do novo Poder de Abril a restituição dos seus terrenos baldios, ocupados pelos Serviços Florestais. Entre fevereiro e abril de 1976, estas aspirações serranas foram de imediato legalmente consagradas com a saída das leis nº 39/76 e 40/76, que devolveram sem delongas este património aos seus legítimos donos – Os Compartes. Em abril desse ano, a Assembleia Constituinte promulgou na Constituição da República Portuguesa – CRP que, no seu ordenamento jurídico-constitucional, definiu estes bens comunitários como bens pertencentes às Comunidades Locais. Uma caracterização específica para a relação de propriedade entre os compartes e as terras comunais, uma propriedade comum, nem pública nem privada! É justo afirmar que tal aquisição e consagração constitucional destes bens comunitários, na nossa CONSTITUIÇÃO, é não só a maior dádiva que abril deu aos Povos Serranos, como ainda a maior valorização jurídico-constitucional da história milenária destes bens comunitários.

Promulgadas que foram as primeiras Leis dos Baldios em 1976 – Decreto-Lei 39/76 e Decreto-Lei 40/76 com o clima de liberdade que se instituiu com a Revolução de Abril, no respaldo da luta dos Povos e dos restantes trabalhadores da cidades que já vinha do tempo da ditadura, facilitada com as “portas que Abril abriu” assistiu-se a catadupas de reuniões populares, para a constituições de Comissões de aldeia, para tratar de problemas locais e simultaneamente organizarem a forma como iam gerir os baldios. Toda essa movimentação, teve vários momentos historicamente significativos como em Agosto de 1974, uma grande concentração em Sever do Vouga, onde se aprovou solenemente a declaração “OS BALDIOS usurpados pelos Serviços Florestais e pelos grandes proprietários devem ser restituídos ao povo”, documento dirigido ao Primeiro-ministro Vasco Gonçalves e Ministros Victor Alves e Álvaro Cunhal, bem como outros documentos/abaixo-assinados que se lhe seguiram de aldeias do Barroso, reclamando ou assumindo que os povos passavam a governar o que era seu, como sempre tinha sido, de direito.

A partir da publicação da Lei dos Baldios, em fevereiro de 1976, por iniciativa dos povos serranos apoiados no início pela SADA (Serviços de Apoio e Dinamização Agrícola) elegeram-se dezenas e dezenas de Conselhos Diretivos de Baldios (CDB) que passaram a gerir diretamente os seus baldios. Foi com base nesta dinâmica que o Movimento dos Baldios se estruturou e organizou 7 Conferências Nacionais, 1 Congresso Ibérico e 3 Congressos Europeus das Áreas Comunitárias, estes últimos em parceria com os representantes da Organização Galega de Comunidades de Montes Veciñais en Man Común e 2 Encontros nacionais dos Agrupamentos dos Baldios.